O presidente Jair Bolsonaro atacou o
presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, ao
dizer que pode "contar a verdade" sobre como o pai dele desapareceu na
ditadura militar. "Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é
que o pai dele desapareceu no período militar, eu conto pra ele. Ele não
vai querer ouvir a verdade", disse.
Felipe é filho de Fernando Augusto de Santa Cruz
Oliveira, integrante do grupo Ação Popular (AP), organização contrária
ao regime militar (1964-1985). Ele foi preso pelo governo em 1974 e
nunca mais foi visto.
Em 2012, no livro "Memórias de uma guerra suja", o
ex-delegado do Dops Cláudio Guerra diz que o corpo de Fernando foi
incinerado no forno de uma usina de açúcar em Campos (RJ).
"Conto pra ele. Não é minha versão. É que a minha
vivência me fez chegar nas conclusões naquele momento. O pai dele
integrou a Ação Popular, o grupo mais sanguinário e violento da
guerrilha lá de Pernambuco e veio desaparecer no Rio de Janeiro", disse
Bolsonaro em coletiva de imprensa.
O Estadão Verifica, serviço do jornal O Estado de S. Paulo, mostrou que o pai de Felipe Santa Cruz, segundo depoimento à Agência Brasil
de um de seus irmãos, João Artur, não era ligado à luta armada. Outros
membros de destaque da AP incluem o ativista Herbert de Souza, o
Betinho, e o ex-senador José Serra (PSDB).
Bolsonaro questionou a atuação da OAB ao falar das
investigações sobre Adélio Bispo, responsável pela facada contra o
presidente no ano passado, durante a campanha eleitoral. Adélio foi
considerado inimputável pela Justiça por transtorno mental. O presidente
não recorreu.
"Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse
no telefone de um dos caríssimos advogados (de Adélio)? Qual a intenção
da OAB? Quem é essa OAB?", disse Bolsonaro. O Estadão Verifica também
mostrou que é falsa a informação de que o sigilo telefônico de Adélio
Bispo é protegido pela OAB. A informação falsa confunde o processo do
acusado com outra ação envolvendo seu advogado, Zanone Manuel de
Oliveira. O boato foi publicado no início do mês no Facebook.
Sobre o fato de não ter recorrido no processo da
facada, Bolsonaro disse que "Adélio se deu mal". "Se eu recorresse, ele
seria julgado não por homicídio, mas tentativa de homicídio, em um ano e
meio ou dois estaria na rua. Como não recorri, agora é maluco o resto
da vida. Vai ficar num manicômio judicial é uma prisão perpétua. Já
fiquei sabendo que está aloprando por lá. Abre a boca, pô", declarou.
Em junho, a Ordem dos Advogados do Brasil já havia se
manifestado sobre fala semelhante do presidente contra a instituição.
"Para que serve essa OAB?", disse Bolsonaro, citando o boato a respeito
de Adélio. "O presidente repete uma informação falsa, que inúmeras vezes
já foi desmentida, de que o sigilo telefônico de Adélio Bispo é
protegido pela OAB", diz a nota, assinada por Felipe Santa Cruz.
Em 2011, ainda como deputado federal, Bolsonaro afirmou
em palestra na Universidade Federal Fluminense (UFF) que Fernando Santa
Cruz, pai do agora presidente da OAB, teria morrido "bêbado" após pular
o carnaval.
À frente da OAB-Rio, Felipe iniciou movimento em 2016
para pedir ao Supremo Tribunal Federal a cassação do mandato de deputado
federal de Jair Bolsonaro por "apologia à tortura ". Ao votar pelo
impeachment de Dilma Rousseff, o então parlamentar fez uma homenagem a
Carlos Brilhante Ustra, que comandou o Doi-Codi de São Paulo, centro de
tortura durante a ditadura.
Agência Estado