Na localidade da Vila Alta, em Nova Olinda, o
ateliê de redes da Mestra Dinha também se torna um museu orgânico. A artesã de 68 anos é a primeira mulher a ser homenageada pelo
projeto encabeçado pelo Sesc, Fecomércio e Fundação
Casa Grande para fortalecer o turismo
cultural nos espaços de memória do Cariri.
Nesta sexta-feira,
às 17h, a casa de Raimunda Ana da Silva, mais conhecida como Dona Dinha,
recebe a cerimônia de inauguração e passa a ser identificada como
Museu Casa Oficina Mestra Dinha, um espaço de tradição importante para a cultura local. O encerramento do festejo terá o forró pé-de-serra
de Joquinha Gonzaga, sobrinho de Luís Gonzaga.
Conheça Mestra Dinha
O barulho da
madeira do tear conduz cada pequeno gesto de Dona Dinha que ainda tem
forças nas pernas e nos braços para puxar o pente. Do bairro Vila Alta
em Nova Olinda, o tempo de Dinha passa na parte de
cima da porta, primeiro pela vista, depois pelos pés. Uma rede por
semana, um ponto por dia e assim por diante.
Católica, Raimunda
Ana da Silva, mais conhecida como Dona Dinha, possui uma imagem de São
Jorge pendurada no alto da porta de entrada da sua casa que,
recentemente, entrou em reforma com a proposta de instalação
do Museu Orgânico. Aos 68 anos, as mãos de Mestra apresentam as marcas
de dois caminhos, da roça e do artesanato. Foi observando a irmã mais
velha fiar e tear redes que Mestra Dinha começou a aprender sobre o
manuseio de tecidos. Ela tinha 12 anos quando fez
a primeira rede e, para ela, o aprendizado era um suspiro para além da
rotina de trabalho.
Nascida em mês de
dezembro e criada na cidade de Nova Olinda, Dinha explica que não sabe
ao certo com quem a irmã aprendeu, apenas quis fazer como ela. “Eu
aprendi vendo as outras pessoas fazendo, fiquei
observando de longe, ela tava fazendo e eu só vendo, daí fui fazer no
outro dia sozinha”, conta. Dos nove irmãos, apenas as mulheres se
interessaram pelas redes. O processo de produção exige de cada artesã um
trabalho específico, por exemplo, Dinha faz a tanga
da rede, o fundo, e as suas irmãs e sobrinhas finalizam o trabalho com
as tranças.
Quando mais nova, a
Mestra relembra que fazia até três redes por dia, hoje se dedica de
forma mais intensa a fazer uma por semana. “Se eu for tirar uma no dia
eu tiro, mas não tem precisão de tecer avexado…
Aí eu cuido de casa, boto uma rede hoje, tiro o pano, boto amanhã”,
explica. Em uma estante no quarto, Dinha mostra os trabalhos recentes e
explica o nome de cada peça diante do próprio ato de fazer da rede. Para
a artesã, hoje não há nenhum processo complicado.
O tempo desfez o mistério.
“Liço”, queixa,
braço, “orgo”, pente, rasteira, cartel, canela e lançadeira são todas as
partes da grande máquina de tear que Mestra Dinha guarda no quintal.
Ela brinca e diz que as madeiras são mais velhas
do que a memória dela. Lado a lado, a antiga máquina disputa espaço com
um modelo mais recente. Embora o pente seja o mesmo, de preferência de
carnaúba, as madeiras estão mais sofisticadas e as linhas mais prontas.
“É a mesma coisa, a diferença é que hoje
tá mais fácil, os fios já vêm prontos. Quero dizer que a gente fazia
isso, comprava o fio, novelava, batia para tingir nos tachos e hoje não,
já vem pronta a mercadoria”, relata sobre o passo a passo enquanto sobe
na máquina e mostra como o corpo faz parte
da arte.
Os pés, em cima de
uma plataforma de madeira, se mexem para frente junto com as pernas e os
braços que fazem o mesmo movimento. Dinha conta que a arte também é
física para o organismo. As redes feitas por
ela são grandes e se destacam diante do formato tradicional comercial
da feira tanto por apresentarem maior resistência como também por
trazerem os pequenos gestos sábios da Mestra.
Dona Dinha lamenta o
fato dos celulares terem distanciado as meninas do artesanato. Pelo
fato da atividade de fazer redes estar associada às mulheres, elas ainda
são as mais presentes no artesanato, embora
o falecido companheiro da Mestra, Gabriel, também ajudasse em alguns
pontos de costura. O desejo de ensinar perpassa a fala de Dinha.
“A gente trabalha
para as mães, tudo junto, hoje somos independentes. Eu digo: ‘vamos
aprender isso aí para essa arte não cair, se um dia eu viajar, vocês
ficam’”, fala. É nesse ponto que a Mestra destaca
a principal utilidade do museu: contar a história das mulheres que
quiseram ir além da roça. “Eu me sinto feliz”, completa a Mestra ao
oferecer uma laranja da fruteira e observar o sol cair atrás na Chapada
do Araripe.
Sobre os Museus Orgânicos
Objetos que
simbolizam as tradições, fotografias, vestimentas, instrumentos são
alguns dos elementos que integram os acervos dos 16 Museus Orgânicos dos
Mestres de Cultura Tradicional do Cariri. Compreendendo
a cultura de tradição como parte integrante da expressão humana, o
Sesc, braço social do Sistema Fecomércio Ceará e Fundação Casa Grande
são incentivadores dos Museus Orgânicos dos Mestres de Cultura
Tradicional do Cariri. A iniciativa tem a missão de trazer
a um circuito de turismo social e cultural e fomentar uma rede de
espaços de memória, fortalecendo essas expressões tradicionais, já
reconhecidas pela comunidade em que cada Mestre vive e construiu sua
história.
Serviço
Inauguração Museu Orgânico
Museu Casa Oficina Mestra Dinha
Museu Casa Oficina Mestra Dinha
Data: 9/8
Horário:17h
Local: Bairro Vila Alta (Rua São Francisco, nº 9) Nova Olinda – CE