Corrinha Lino e familiares de Ribuliço. (FOTO/João Alves). |
Texto: Nicolau Neto
O auditório
da Secretaria de Assistência Social de Altaneira, na microrregião do cariri
oeste, foi palco na noite deste sábado, 17, da cerimônia de posse da professora
Maria Oliveira Lino, popularmente conhecida por Corrinha Lino, na Academia de
Letras do Brasil/Seccional Araripe.
O
evento que contou com a participação de parte dos acadêmicos e acadêmicas que
compõem a Academia de Letras do Brasil/Seccional Regional Araripe, de
professores/as, familiares, amigos e amigas, além do presidente da seccional Araripe,
o poeta Adriano Sousa, visou oficializar o assento da acadêmica na cadeira nº
31.
No
seu discurso de posse ela teceu agradecimentos ao presidente da entidade pela
oportunidade de compor o grupo de acadêmicos/as, aos familiares do seu patrono por
terem contribuído para sua pesquisa. Segunda ela, o próximo passo será escrever
um livro. “É meu grande sonho”, pontuou.
Corrinha
escolheu como patrono Antônio Rodrigues dos Santos, que passou para o imaginário
altaneirense como “Ribuliço, e que foi funcionário público e exerceu com
maestria (mesmo sem dispor de grande leitura pois cursou apenas as séries
iniciais do ensino fundamental I) o ofício de poeta popular.
No
seu trabalho de pesquisa, a acadêmica enfatiza que “a profissão de motorista favorecia” a Ribuliço “o contato com muitas pessoas das mais
diversas classes sociais” e que “sua
inspiração era a diversidade de lugares por onde passava e a quantidade de
pessoas que conhecia. Ao ouvi-las sua imaginação trabalhava juntando palavras
que constituiria os versos”.
“Foi um poeta corajoso. Jamais teve medo de denunciar as injustiças sócias quando ia compor algo que tinha o teor de denuncia porque prejudicava a muitos e o deixava triste”, destacou Corrinha.
Quem foi Ribuliço
Antonio
Rodrigues dos Santos nasceu no dia 10 de maio de 1942 no sítio Massapê,
município de Nova Olinda, localizado ao sul do estado do Ceará. Filho do
segundo casamento de Benjamim Rodrigues dos Santos com Joana Maria da Soledade.
O Sr.Benjamim casou-se duas vezes. A viuvez do primeiro casamento lhe deixou
dois filhos: o Sr. Sebasto dos Santos e a Sra. Maria dos Santos. Enquanto o
segundo casamento lhe dava mais dois filhos: Antonio Rodrigues dos Santos e
Valdemar Rodrigues dos Santos.
Banner apresentado por Corrinha Lino. Arte de Aldemir Ribeiro.(FOTO/Nicolau Neto). |
Sem
a presença paterna, os dois irmãos, ainda crianças, tiveram que trabalhar na
roça para sobreviverem. Os companheiros da roça eram os primos filhos de Dona
Maria. Seu primo, Francisco Pereira dos Santos (Xuta), lembra que ele não
gostava do referido trabalho, o seu sonho era ser motorista. Mas conta que
nessa época já recitava pequenos versos, e que seu dom era invejável.
Por
volta dos 11 anos de idade, mudou-se para a cidade de Altaneira com a sua mãe e
seu irmão, Valdemar Rodrigues dos Santos que era seu irmão mais velho, ali eles
fizeram novas amizades. Sua mãe logo se envolveu com a comunidade altaneirense
e ganhou amizade e admiração, conhecida por todos como dona Joaninha. Era uma
pessoa amável, gostava de compor versos improvisados, muito católica,
benzedeira, mãe muito dedicada e que não deixou de cumprir com o papel de mãe e
pai ao mesmo tempo.
“Ribuliço”
cresceu e se envolvia com a comunidade, não demorou muito já começava a
aprender a dirigir, realizando seu sonho poucos anos depois, não se dedicou ao
estudo, mas cursou os primeiros anos do ensino fundamental I, o que foi
suficiente para aprender a ler e escrever e a compor seus versos que deixava
escrito em pequenos cadernos.
Aos
34 anos de idade casou-se com Maria Soares dos Santos. Nesse período Maria
tinha vinte cinco anos e morava na localidade da Andreza - município de Assaré.
O casamento realizou-se no Distrito Amaro, também município de Assaré, no dia
30 de outubro de 1975. Em seguida vieram morar em Altaneira. Maria Conta que se
conheceram em uma festa da padroeira Santa Teresa de Jesus em Altaneira, e com
um ano de namoro casaram-se. Dessa união nasceram 03 filhos, Cícero Rodrigues
dos Santos, Dasdores Rodrigues Soares e José Rodrigues Soares(in memoria).
Relata ainda que ele gostava de poesias e que seu poeta preferido era Patativa
do Assaré.
Sobre
a obra do referido poeta, sua esposa Maria diz: - “Ribuliço” quando tinha um
pouco de tempo compunha versos dos mais variados temas e quando faleceu deixou
muitos escritos, mas infelizmente na atualidade os versos não existem mais. O
material todo desapareceu.
Maria
lembra que uma pessoa interessada em divulgar o trabalho do poeta seu esposo,
pediu para levar até a gráfica, mas a referida pessoa ao entrar de férias
deixou esse material no seu trabalho, quando retornou tinham feito uma limpeza
no ambiente e todo o material do poeta popular desaparecera. Maria deixa claro
sua tristeza e dos seus filhos, pois eram muitas poesias, dava para publicar um
livro.
Ainda
falando dos seus dias ao lado do poeta, Maria conta que a vida foi difícil, mas
que seu esposo era um homem trabalhador e temente a Deus, tinha muita fé no
Padre Cícero e vestia preto nos dias vinte de cada mês.
Para
sobreviverem no início do casamento “Ribuliço” trabalhava realizando fretes em
um Jipe que pertencia a ele e ao seu irmão Valdemar, jipe esse que perderam em
uma aposta política, prática muito comum na época. Sem o Jipe passou a
trabalhar como motorista particular, lembra que o mesmo por muitos anos foi
motorista do Sr. João Duarte(in memoria), e do Sr. José Lino da Silva (in
memoria).
No
dia 1º de março de 1981 foi admitido como funcionário público municipal e
assumiu sua profissão de motorista. Na época o prefeito era o Sr. João Ivan
Alcântara.
Ainda
em depoimento de Maria Rodrigues Soares, ela nos diz que lembra também momentos
que conviveu com a mãe do poeta, dona Joaninha, ela diz que a mesma era uma
senhora humilde, muito boa, muito católica e que os ajudava muito nos momentos
de dificuldades.
A
vida de “Ribuliço” era de muitas ocupações dado o seu trabalho como motorista.
Estava sempre em viagens para o Crato, Juazeiro e Barbalha, quase não sobrava
tempo para a família.
Certo
dia a família percebeu que o patriarca estava emagrecendo com muita rapidez,
mesmo se alimentando normalmente, o que fez com que ele fosse fazer uma
consulta e realizar exames, diante dos resultados descobriu que estava portador
de Diabetes, para o mesmo foi muito ruim, pois gostava de comer de tudo,
principalmente doces. Mas continuou com seu trabalho e com as atividades
literárias que o enchia de alegria. Cinco anos após a descoberta, ficou muito
debilitado, já apresentava pressão alta, aceleramento no coração e uma impaciência
muito grande. E no dia 18 de agosto de 2001 deixou a vida terrena, vítima de
Infarto Agudo do Miocárdio-IAM, aos 59 anos.
Dona
Maria conta que foi uma tristeza muito grande para ela e seus filhos.
A
acadêmica conta que pouca coisa restou do trabalho poético de Ribuliço e que
uma das poesias que conseguiu foi com seu filho Cícero Rodrigues falando sobre
o “Desafio do Orgulhoso” (Ver abaixo):
Você
pensa que é bonito
Com
esta roupa de linho
Só
anda bem perfumado
Para
ficar bem cherozinho
Quero
ver você cherando
Quando
chegar o seu fim.
Ouço
alguém dizer assim
Eu
sou um cara bonito
Mas
para ser mais do que eu
Eu
morro e não acredito
Depois
da terra comer
Tudo
se torna esquisito.
Fui
assistir um enterro
De
um cidadão de bem
Lá
eu vi umas ossadas
Que
as mesmas foi de alguém
Eu
parei para pensar
Pude
bem analisar
Que
nós não somos ninguém.
Quando
olhar um esqueleto
Não
precisa entristecer
Que
o nosso futuro é este
Não
tem onde se esconder
É
uma coisa esquisita
Não
tem caveira bonita
Nem
bravo para não morrer.
Saiba
que não temos nada
Compreenda
assim como eu
Acredite
mais em Deus
Deixe
de ser tão ateu
Tudo
o que nós possuímos
Foi
nosso pai quem nos deu.
A
morte é uma carrasca
Ela
não é ninguém
Mata
rico milionário
E
mata o pobre também
Passa
tudo na moela
Mesmo
assim eu gosto dela
Que
a todo mundo ela vem.
Seja
gentil e humano
Proteja
o fraco e o forte
Confiando
sempre em Deus
Que
Ele muda sua sorte
Não
faça dos outros entulhos
Acabe
com esse orgulho
Que
o futuro é a morte.
Para
quem for orgulhoso
Tome
essa por lição
Lembrando
que é Deus que manda
Em
toda essa nação
Toda
nossa vaidade
Termina
debaixo do chão.
Quando
estiver bem trajado
Jovem,
ancião ou senhora
Que
encontrar um coitado
Aquele
que o pão lhe implora
Nunca
vire sua cabeça
E
também nunca se esqueça
Que
o luxo é só por fora.
Aqui
termino meu verso
Com
minha pouca leitura
Peço
desculpas aos amigos
Em
minha literatura
Dê
comida a quem tem fome
Que
todo orgulho do homem
Termina
na sepultura.
Sobre a acadêmica
Maria
Oliveira Lina é graduada em Geografia pela Universidade Regional do Cariri
(URCA) e especialista em Meio Ambiente. Exerceu o cargo de diretora da Escola
de Ensino Fundamental 18 de Dezembro e da Escola de Educação Infantil
Professora Fausta Venâncio, além de ter sido coordenadora escolar da Escola
Municipal de Ensino Fundamental Joaquim Rufino de Oliveira.
Clique aqui e confira integra do discurso de posse de Corrinha Lino na Academia de Letras do Brasil/Seccional Araripe.
Clique aqui e confira integra do discurso de posse de Corrinha Lino na Academia de Letras do Brasil/Seccional Araripe.
Blog Negro Nicolau