Menina santa em vida. Era muito boa, temente a Deus, amava a natureza, gostava de crianças e de idosos”. As declarações são de Nair Sobreira, 83 anos, amiga de infância de Benigna Cardoso da Silva, cujo martírio foi reconhecido pelo Papa Francisco e, em breve, será reconhecida como beata, um passo antes da canonização.


Nair Sobreira conviveu com a menina Benigna, a mártir heroína da castidade.

O Blog Ancoradouro obteve com exclusividade  entrevista com a mulher que conviveu com Benigna, na localidade Oiti, em Santana do Cariri. “Tenho muitas saudades do nosso tempo”, recorda Nair. Lúcida a idosa conta como era a criança que atrai uma multidão todo dia 24 de outubro, na romaria em que se recorda o martírio da futura beata.

Nair descreve como Benigna era fisicamente: “uma menina franzina, cor morena, cabelos longos repartidos ao meio”. Era muito simples, “não tinha nenhuma vaidade”. Mas o que chamava mesmo a atenção era a caridade de Benigna e seu temor a Deus. 

“Na escola era a primeira da classe, muito estudiosa. Tinha muito cuidado com as outras crianças, fazia questão que elas  estudassem e aprendessem a tabuada [para não serem castigas com a palmatória, prática escolar da época]”, rememora a amiga de infância.


Benigna nasceu em Oiti, em Santana do Cariri.

Depois que a mãe de Benigna morreu, ela ainda bebezinha foi entregue aos cuidados de dona Irene Sisnando, a dona da casa grande da região, que a levou para São Gonçalo. Aos dez anos, Benigna volta para Oiti, onde nasceu, agora para ajudar a irmã de dona Irene, acometida de severo problema de visão. “Eu via muita caridade na Benigna, pois ela cuidava muito bem de Osina”, testemunha.

Romaria de Benigna reúne multidão todos os anos.

No mês de outubro, Benigna não dormia sem recitar o Santo Rosário, conta Nair. “Eu como criança não aguentava rezar nem o Terço, mas ela rezava o Rosário todo e ainda outras devoções. Era muito devota de Nossa Senhora do Rosário e de Nossa Senhora do Carmo”.

Emocionada a colega de infância  relembra como foi o dia trágico em que Benigna foi assassinada. “A morte de Benigna foi triste, como sempre é. Naquele dia, às cinco horas da tarde, quando voltou para casa, a tia Osina falou para Benigna que já estava tarde, o sol quase se pondo e o  pote de por água estava seco e ela ainda teria de fazer o jantar”. 

“Benigna logo se encarregou de ir pegar a água no poço, bem perto da casa,  enquanto deixava o arroz no fogo”. No local, próximo de um moita baixa, o malfeitor Raul, de 18 anos,  já se encontrava cheio de desejosos luxuriosos por Benigna.

Benigna foi martirizada aos 13 anos de idade.

O homem retirou o pote da cabeça da menina e começou a ameaçá-la. Benigna foi firme, falou que nada queria com ele, nem com ninguém. Puxando a arma, Raul perguntou: “Mas você vai querer namorar com este pranchão [facão]?” Benigna não quis conversa e o homem logo  começou a golpeá-la. O assassino cortou os dedos da menina, e dois rasgos nas suas costas. “O último golpe foi no pescoço que o deixou partido,  ligado ao corpo apenas por um  ‘courinho'”.

Nair recorda que Raul contara na delegacia que depois do crime ficou escondido atrás da moita grande, perto da casa. Sentindo a demora, Tia Osina foi à  cacimba  para procurar Benigna e qual não foi sua surpresa, a idosa quase cega tropeçou no corpo caída de Benigna.

O corpinho da criança foi  velado na casa, no dia seguinte  levado para Santana do Cariri. “Foi um dia muito triste, muito triste”, relembra Nair,  entre  lágrimas de saudades. “Seu martírio foi em uma sexta-feira”. No sábado, a polícia já saiu a busca de Raul. Sua casa ficava em  frente da Capela de Oiti. Raul confessou o crime e cumpriu a pena.

Benigna será beatificada.

Depois de ter vagado por Fortaleza e São Paulo, cinquenta anos depois o assassino voltou ao local do crime. Em seu túmulo depôs um ramalhete de flores. “Lá chorou e pediu perdão”, conta Nair. Ao retornar para São Paulo foi acometido de um câncer e faleceu.

Nair ainda conta, em outros dois vídeos gravados para o Ancoradouro,  mais detalhes sobre a vida de Benigna, suas brincadeiras preferidas e a devoção que cresceu na região em torno da amiga que morreu para defender a castidade, um exemplo para aquele e para este tempo.


O Blog Ancoradouro agradece à colaboração de Ypsilon Rodrigues Félix e Marcos Danilo Estevam Sobreira, que auxiliaram nesta nesta entrevista exclusiva. 


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