O governo de Jair Bolsonaro, reformista na
economia, iniciou o primeiro ano de mandato com o grande desafio de
manter o programa Bolsa Família, que mesmo, historicamente, criticado
pelo presidente, permanece com forte aceitação, especialmente junto aos
segmentos mais pobres do País. Na chegada de 2020, beneficiários e
especialistas manifestam incertezas quanto ao futuro do programa,
considerando-se, especialmente, o enxugamento no número de cadastrados
que aconteceu ao longo de 2019 e, nos últimos dias, com o anúncio de uma
reformulação pelo ministro da Cidadania, Osmar Terra.
No Ceará, em 2019, o governo federal destinou mais de
R$ 2,5 bilhões para atender mais de 1 milhão de famílias cadastradas.
Uma delas localizada pelo O POVO em Fortaleza, na Barra
do Ceará, chefiada por Janiele Nascimento, de 32 anos. Em 2012, a
Defesa Civil aconselhara a dona de casa a buscar o Bolsa Família e,
desde então, o benefício é utilizado para suprir itens básicos da rotina
familiar, além de servir como auxílio para seu tratamento contra a
tuberculose, contraída aos 18 anos. "Eu uso o dinheiro, como sempre,
para necessidades básicas, como alimentação, educação dos meus filhos e
minha saúde, que não anda muito boa. É apertado, mas dá", afirma.
Em 2017, Janiele diz ter sido expulsa de sua casa
própria por uma facção criminosa e, junto do marido e dos três filhos,
perambulou por diversos pontos da capital. Entretanto, com o programa
ela afirma ter conseguido manter a família. "Eu tenho passado por vários
cantos e é como se a gente não tivesse um valor. Não é porque eu queira
ficar sem fazer nada, mas é porque eu me trato da tuberculose, então,
por enquanto, só me vejo focada no meu tratamento e nos meus filhos",
revela.
Mesmo com duas transições - a primeira com a chegada de
Temer, em 2015, e depois com Jair Bolsonaro, em 2019 -, Janiele afirma
não ter enfrentado problema durante os oito anos de recebimento das
parcelas e, inclusive, elogia a novidade da 13ª parcela para os
beneficiários implantada em dezembro do ano passado, já no atual
governo. "Sempre foi o mesmo valor de R$ 212,00 e modificou só agora com
o abono natalino que ajudou bastante. Eu vejo como um incentivo que vai
continuar, porque quero melhorar de vida, conseguir um bom emprego".
Criado em 2003, o Bolsa Família é
um programa de transferência de renda do governo federal que tem o
objetivo de combater a extrema pobreza no País. Hoje, ele atende pessoas
que vivem em situação de extrema pobreza, com renda per capita de até
R$ 89 mensais, e pobreza, com renda entre R$ 89,01 e R$ 178 por mês. Em
novembro de 2019, a cobertura do programa foi estimada em 13,2 milhões
de famílias. O benefício médio atual é de R$ 191,08 por família.
No começo de 2019, o programa cresceu e atingiu o auge
em maio, quando 14,3 milhões de famílias foram atendidas. Porém, diante
de dificuldades orçamentárias, registrou seguidas quedas. O projeto de
Orçamento elaborado pela equipe econômica reservou R$ 29,5 bilhões para o
programa no próximo ano - menos que os R$ 32 bilhões de 2019 e sem a
previsão do 13º para beneficiários, prometido pelo presidente. A
expectativa é que 13,2 milhões de famílias sejam atendidas em 2020,
mesma cobertura registrada em novembro, após os sucessivos enxugamentos
promovidos por Bolsonaro.
Além dos cortes, a redução no número de benefícios
também é uma consequência dos programas sociais de impacto, já que as
pessoas podem ficar independentes da assistência. Esse é o caso de
Emanuela De Souza, 33 anos, que receberá em janeiro a última parcela do
Bolsa Família, após arrumar emprego como costureira.
"Quando meus
meninos eram pequenininhos, eu precisei. Soube pela televisão, fui no
Cras do Novo Maracanaú, onde moro, e solicitei o benefício. Eu recebo
pelos dois filhos que tenho na escola e isso ajuda muito para comprar o
material escolar e a alimentação" afirma.
Mãe de dois filhos e casada, Emanuela já participou do
programa como dependente aos 14 anos. Hoje, ela revela que, na família,
outras três pessoas são beneficiárias. " Graças a Deus minha família
quase toda tem, as minhas duas irmãs e minha sobrinha. Como de costume,
agora em 2019 eu não tive dificuldades para receber e acho que o Bolsa
Família deve continuar porque beneficia muitas pessoas" declara.
Mesmo após conseguir a carteira de motorista e o curso
de costureira por meio do Bolsa Família, Emanuela demonstra temor sobre o
futuro do programa. "Eu tenho uma visão um pouco negativa, do jeito que
está hoje não sei muito o que pode acontecer, com esse governo fica
meio incerto", ressalta.
o Povo
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