Não é só a capacidade de leitos em hospitais que vive hoje sob pressão do
novo coronavírus no Ceará. Na linha de frente do combate à doença,
profissionais de saúde como médicos, enfermeiros e fisioterapeutas
também correm risco de ter disponibilidade ameaçada por uma provável
disseminação em massa no Estado. Diante da crise, lideranças das
categorias defendem pressa e qualificação urgente para fortalecer
fileiras de combate à pandemia.
"Em situação de normalidade já não estão sobrando
médicos, imagina em uma crise como essa", afirma o presidente do
Conselho Regional de Medicina do Ceará (Cremec), Helvécio Feitosa. "Para
se ter ideia, hoje não temos intensivistas, que são os médicos
especializados no atendimento de UTIs, para cobrir nem as necessidades
da normalidade". Atualmente, o Ceará tem cerca de 14 mil médicos ativos,
9 mil fisioterapeutas e 76 mil profissionais de enfermagem.
Para reduzir a deficiência de profissionais, o governo
federal editou duas principais medidas. Primeiro, portaria do Ministério
da Educação (MEC) do final de março liberou a antecipação da formatura
de estudantes de cursos da saúde para atuação na crise. A segunda, do
Ministério da Saúde, criou a ação "O Brasil Conta Comigo", que busca
cadastrar profissionais de 14 categorias para capacitação de
enfrentamento à pandemia. Segundo a pasta, capacidade do sistema de
saúde para atender pacientes da Covid-19 será esgotado ainda em abril.
Inicialmente, o cadastro causou controvérsia porque, ao anunciar a medida, o ministro Henrique Mandetta sugeriu que se trataria de uma "convocação" de profissionais para a crise.
Depois, a pasta recuou e passou a chamar a ação como um "voluntariado".
A ideia, segundo o decreto, é capacitar os agentes para que eles atuem
como consultores na mobilização contra a Covid-19 e, apenas em caso de
extrema necessidade, atendam diretamente pacientes.
Com a mudança de tom, a ação ganhou maior adesão das
categorias. "Estamos vivendo um momento em que foi decretado calamidade
em vários estados, inclusive o Ceará. Isso é sem precedente na história.
Nossa geração nem a anterior viveram isso, fora em tempos de guerra.
Eu, como profissional, quero me cadastrar para ajudar. Creio que os
profissionais entendem que isso é importante", diz Edmar Fernandes,
presidente do Sindicato dos Médicos do Ceará.
Edmar destaca ainda que, no decreto, não há qualquer
previsão de obrigação ou punição para os profissionais cadastrados.
"Está havendo um grande esforço de formação e capacitação de médicos e
profissionais. Logicamente não é a condição ideal, porque um curso de
intensivista duraria normalmente três anos", reforça Helvécio Feitosa.
Presidente do Conselho Regional de Fisioterapia e
Terapia Ocupacional do Ceará, o fisioterapeuta Ricardo Lotif estima que,
atualmente, cerca de 40% da categoria esteja diretamente envolvida no
combate ao novo coronavírus. Ele afirma que a portaria do MS é
"importante" para o atual momento, mas se diz preocupado com pontos como
a possibilidade de convocação de recém-formados. "Não somos contra, mas
é preciso esclarecer isso", diz.
"O último ano do curso é o momento que o estudante está
no hospital. Se ele sai antes, não vai ter um bom desempenho para
atender. Como será esse treinamento, com que tempo?". Como a
fisioterapia respiratória é fundamental no tratamento da Covid-19, a
expectativa do MS é ter pelo menos um profissional para cada 10 leitos
de UTI. "Agora, o tempo é o nosso maior inimigo. Se um bom treinamento
leva no mínimo 15 dias, era para ter começado ontem".
O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), por sua vez,
expediu resolução recomendando que todos os profissionais da categoria
se cadastrem no programa do governo. "Considerando a importância da
equipe de Enfermagem no combate à pandemia e a necessidade de somarmos
esforços com as autoridades de saúde pública", justificou na nota o
presidente do Cofen, Manoel Neri.
o Povo