O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a declaração de inconstitucionalidade do “auxílio-livro” para magistrados e membros do Tribunal de Contas e do Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MP-MT). Cada integrante dessas carreiras recebe R$ 70 mil por ano de benefício, o que, segundo a ação, configura “dano econômico de incerta ou de difícil reparação”.
Na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), com pedido de medida cautelar, Aras destaca a urgente necessidade de acabar com esse tipo de pagamento, tecnicamente chamado de “auxílio para aquisição de obras técnicas”. A ação, publicada na quinta-feira (17), é restrita ao caso de Mato Grosso, apesar de os pagamentos serem realizados em todo o Brasil.
No caso de Mato Grosso, o penduricalho está previsto nas Leis 4.964/1985 e 8.316/.2005. Segundo a arguição, os dispositivos violam o regime remuneratório por subsídio fixado em parcela única, previsto na Constituição Federal, e a competência da União para dispor sobre regime jurídico nacionalmente unificado dos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público.
“O regime constitucional de pagamento unitário que caracteriza o modelo do subsídio repele acréscimos remuneratórios devidos pelo trabalho ordinário de agentes públicos. O art. 39, § 4º, da CF, é expresso ao vedar acréscimo de gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação e outras espécies remuneratórias à parcela única”, diz um trecho da arguição.
O dispositivo citado diz que “o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única”.
O próprio STF fixou jurisprudência para reconhecer impossibilidade de pagamento a agentes públicos que recebem subsídio de gratificações não correspondentes a atividades extraordinárias.
As exceções à regra são relacionadas a parcelas adicionais que tenham fundamento em acréscimo extraordinário de atribuições e responsabilidades ou nítido caráter indenizatório. Ou seja, verbas para compensar o beneficiário por despesas efetuadas no exercício do cargo, como diárias e verbas de transporte para custear deslocamentos no interesse do serviço.
“Conquanto a formação e a atualização jurídica daqueles agentes públicos sejam de inegável importância, não se pode compreender que a aquisição de obras técnicas tenha nexo direto com o cargo. Tais gastos têm relação indireta e subsidiária com o exercício da função e não se podem confundir, por exemplo, com o pagamento de diárias, que constituem reembolso com despesas decorrentes do labor jurisdicional”.
No documento, Aras destaca, também, que a Emenda Constitucional 19/1998 modificou o sistema remuneratório dos agentes públicos e fixou o subsídio como forma de remunerar certas categorias de servidores, incluídos os membros da magistratura e do Ministério Público.
O objetivo, de acordo com o procurador, foi garantir maior transparência, critérios paritários e claros, em reforço ao caráter democrático e republicano do Estado brasileiro e aos princípios da isonomia, da moralidade e da publicidade.
Em meio ao impasse, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) editaram atos normativos para impedir o acúmulo desordenado de parcelas com subsídio de modo a evitar vantagens injustificadas que algumas leis estaduais têm concedido a magistrados e membros do MP.
Aras também entende que as leis estaduais usurparam a competência legislativa da União para disciplinar, mediante lei complementar, o regime jurídico nacional daquelas carreiras. Por isso, o procurador pediu a concessão de medida cautelar para barrar o que ele chamou de “pagamentos indevidos”.
“O perigo na demora processual (periculum in mora) está no impacto financeiro significativo decorrente da possibilidade de pagamentos indevidos a membros do Tribunal de Justiça, do Tribunal de Contas e do Ministério Público de Mato Grosso, por força das normas estaduais ora questionadas”.
Caso o STF declare a inconstitucionalidade do “auxílio-livro”, a decisão poderá provocar efeito dominó e ser estendida a todos os demais órgãos que façam o mesmo tipo de pagamento a seus membros. Ainda não há previsão de o Supremo julgar o pedido.