Jamille Bezerra, de 28 anos, natural de Maracanaú, é uma das muitas jovens que desafiaram as estatísticas e conquistaram o sonho de ingressar em uma instituição de ensino pública. A filha do meio de cinco irmãos levou uma vassoura e uma pá para as fotos de formatura.
Ela está no último semestre de Gastronomia no Instituto Federal do Ceará (IFCE), campus de Baturité, a 100 km da capital do Ceará. A escolha do curso não foi por acaso: “Minha mãe sempre foi cozinheira, e eu quis seguir os passos dela”, conta.
Maria Conceição, sua mãe, de 54 anos, é diarista e mãe solo. Com o ensino fundamental incompleto, sempre incentivou Jamille e os outros quatro filhos a priorizarem os estudos, mesmo enfrentando as dificuldades econômicas de sua profissão.
Na busca por inspiração para suas fotos de formatura, Jamille encontrou um vídeo nas redes sociais que a emocionou. Nele, uma jovem homenageava a mãe, diarista, tirando fotos com uma vassoura. A cena a fez refletir sobre a própria história e sobre a dedicação de sua mãe para que ela chegasse até ali.
“Era uma forma de mostrar o quanto minha mãe foi importante para o meu sucesso”, revela Jamille. Na foto, ela escolheu levar uma vassoura e uma pá, símbolos do trabalho de Maria Conceição e de tantas outras trabalhadoras domésticas que, mesmo sem os devidos reconhecimentos, são essenciais para o funcionamento das casas e da economia.
Maria Conceição sonha em abrir seu próprio negócio e vender lanches, algo relacionado ao seu amor pela cozinha. Ela nunca teve a oportunidade de estudar além do ensino fundamental, mas sempre priorizou a educação dos filhos.
“Lembro de ela passar horas encapando nossos livros, garantindo que tivéssemos os melhores materiais”, relembra Jamille com carinho. Hoje, apesar da luta financeira, sua mãe e seus irmãos são seus maiores apoiadores, ajudando com os custos da faculdade.
“A ajuda da faculdade é importante, mas o resto vem de nós, da minha mãe e dos meus irmãos”, conta Jamille, que finaliza o curso com o apoio de sua família.
O desafio do mercado de trabalho para empregadas domésticas
A história de Maria Conceição é de luta e superação, mas também reflete a realidade de muitas mulheres que trabalham como diaristas no Brasil. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra por Domicílio (PNAD), os números de empregados domésticos aumentaram ligeiramente nos últimos anos e a informalidade e a baixa remuneração seguem sendo desafios imensos para esse setor.
A pesquisa de 2023 revelou que a maioria das diaristas no País recebe menos de um salário-mínimo e que a taxa de formalização, ou seja, de trabalhadores com carteira assinada, caiu para 23,3%, a mais baixa da série histórica desde 2012.
Para elas, como Maria Conceição, a vida é marcada pela constante luta para garantir o sustento da família. Apesar disso, muitas têm se dedicado à educação dos filhos, criando uma nova geração com acesso ao ensino superior. No caso de Jamille, sua história se soma a um movimento mais amplo de transformação social.
“É com essa pá e vassoura que ela vai formar a terceira filha em uma instituição federal”, comenta Jamille nas redes sociais, com a certeza de que a educação pode ser a chave para quebrar ciclos de pobreza e abrir novas possibilidades para as próximas gerações.
o Povo